O Departamento de
Voleibol, contratou o Professor Carlos Simão, para coordenar toda a formação
axadrezada, numa clara aposta no futuro.
Para conhecermos melhor
todo o projecto, realizamos uma entrevista, na qual o novo técnico axadrezado
se apresentou pessoalmente e deu a conhecer, ideias e objectivos.
APRESENTAÇÃO
Vamos apresentar o Carlos
Simão. Qual o seu passado no Voleibol?
Comecei a praticar Voleibol,
com oito anos de idade, em Vila Real, cidade da qual sou natural. Joguei sempre
(dezassete anos) até aos vinte e cinco anos, altura em que terminei a
faculdade.
Façamos um resumo da
sua carreira, para todos o conhecermos melhor…
Como disse, joguei até aos vinte e cinco anos, mas com a idade de dezasseis, tive a minha primeira
experiência como treinador, também em Vila Real, num escalão de formação
feminino. O Voleibol feminino, já nessa altura, tinha grande tradição em Vila
Real e, por exemplo, o Boavista, deslocou-se várias vezes à cidade, com a sua
equipa sénior, para os campeonatos nacionais. Foi, desta forma, que me iniciei
como técnico, no ano de mil novecentos e oitenta e seis.
Posteriormente, deixou
de treinar equipas de formação, passando para o esclão sénior. Como se
processou essa alteração?
Em noventa e dois, o
Castêlo da Maia, faz-me o primeiro convite, que não pude aceitar. Estava a
terminar o curso e não pude vir. Passei a representar o Castêlo, dois anos
depois, para a época de 94/95. Fui treinador adjunto, com o Professor José
Moreira, trabalhando com a formação masculina. Também aqui, aconteceu uma
alteração, porque em todos anos anteriores trabalhei sempre com formação
feminina.
O que recorda dessa
primeira experiência?
Foram três anos muito
bem passados. Ganhei um título Nacional de Iniciados. Na qualidade de adjunto,
ganhamos uma Supertaça e daí “salto a para a Académica de Espinho.
Falemos então da experiência
em Espinho. Quantos anos, esteve em Espinho?
Estive oito anos
consecutivos e oito anos fantásticos! Aliás, por todos os clubes onde passei,
vivi sempre experiências muito boas.
Regressemos a Espinho…
Nesses oito anos,
conquistamos um título Nacional de Juniores e um vice-campeão. Nesse período,
ajudo a equipa sénior a subir à primeira divisão nacional. Tenho assim, uma
subida de divisão.
Ao que eu sei, depois
dessa fase, ingressa no Boavista. Confirma?
Confirmo. No ano de
2005/6, ingresso no Boavista para trabalhar com o Professor José Machado, na
equipa sénior. Trabalhei com o José Machado, durante um ano. A Dani e a Marta Massada,
foram, inclusive, minhas atletas. A Dani, já tinha sido minha atleta no Castêlo
da Maia. Estive, somente um ano, porque o Professor José Machado saiu. Eu fui
convidado para assumir o cargo principal, mas não aceitei, por solidariedade
com o Professor, dado, que foi ele que me tinha convidado para vir para o
Boavista. Expliquei isso ao falecido José Manuel Palmeira, ele e a Graziela,
entenderam muito bem a minha posição.
Está só uma época, mas
sai sem problema algum?
Exactamente. Como disse,
expliquei aos Directores a minha razão e saí a bem. Conversamos, como pessoas
sérias e o José Palmeira aceitou a explicação e todos continuamos bem.
Segue-se…?
Tive um convite do Ribeirense,
que não pude aceitar por motivos profissionais, por não ter conseguido o
destacamento para os Açores. Foi assim, que ingressei no Esmoriz. Estive lá dois
anos, o primeiro nos Juniores e outros nos seniores. Depois em dois mil e oito,
vou para o Gueifães.
Onde estava
actualmente?
Sim, após sete anos
maravilhosos e agora regresso ao Boavista, após quase trinta anos de carreira
no voleibol.
Qual a sua profissão?
Sou professor de
Educação Física na escola de Águas Santas e resido na Maia.
BOAVISTA FC
Como se processa o
regresso ao Boavista?
Foi um pouco… por
acaso, mas com muita influência do Professor José Machado, que em conversas que
tivemos ao longo da época, me foi apresentando o desafio. Eu treinava as
seniores do Gueifães, fomos adversárias do Boavista, neste campeonato.
Ele diz, que foi você que
lhe estragou o campeonato. O Boavista, andava muito bem e no jogo com o Gueifães…
perdeu-se e demorou a reencontrar-se…
Tenho que reconhecer
que ganhamos por 3/2 com um erro do árbitro. Temos que reconhecer, mas nada
mais que isso.
Voltando ao convite…
Falamos várias vezes.
O Professor, sempre me falou da formação do Boavista e me foi desafiando. Devo dizer
que saí do Gueifães de uma forma muito cordial depois de sete anos
maravilhosos. E em total harmonia com a direcção.
O que pesou?
Foi-me apresentado um
desafio. Eu tenho quarenta e sete anos e não resisto a um desafio e continuo a
gostar de enfrentar novos desafios.
O Boavista é um
desafio para si?
O Boavista, foi em
outros tempos, uma grande potência do Voleibol Feminino de Portugal. Isso durou
até a “infeliz” destruição do Pavilhão Acácio Lelo. Nessa altura, notou-se uma
quebra no departamento. Mas, eu acho, que a mística está lá dentro. Está apenas
um pouco adormecida.
Não sou nenhum mágico, mas venho imbuído num espirito
lutador e agressivo, que me caracteriza e vou tentar ajudar a reerguer o Boavista,
no Voleibol.
O professor vem
exclusivamente para coordenar a formação?
Em princípio o convite
que me apresentou o José Machado era para ir trabalhar para as seniores, mas
uma das coisas que me dá enorme prazer, é ver as miúdas crescer, implementar
modelos de jogo e sistema de formação muito bem cimentadas. Por isso, recusei
as seniores e venho exclusivamente para a formação. Vou ser o coordenador de toda
a formação desde o minivoleibol até às juniores.
Só como coordenador?
E treinar uma equipa
de formação, porque eu disse, logo, que jamais conseguiria ficar com um cargo
meramente administrativo. Caracterizo-me a mim próprio como um treinador de
campo.
Objectivos? A curto e
médio prazo?
O plano tem duas
fases. O primeiro passo foi apresentar o nosso projecto aos pais das atletas. Tive
conhecimento de um número considerável de saídas de atletas na época passada. É
meu princípio, defender que todas as atletas devem tomar o rumo que querem e
não devemos andar atrás, nem nos rebaixarmos por decisões que atletas ou pais
tomem. As que ficaram, são as que temos e com elas vamos trabalhar. Temos encetado
contactos, para estabelecer protocolos com várias escolas para podermos
recrutar atletas e massificar o minivoleibol.
Tenho trabalhado, há
poucos dias, mas temos feito uma divulgação por vários meios para recrutar
atletas e temos tido uma resposta bastante positiva. Esta fase, será a de
recrutamento e massificação.
É evidente, que as atletas que já passaram pelo
Boavista e que queiram regressar, não vejo, de todo qualquer problema. Espero que
vejam nesta nova imagem, que estamos a criar uma boa prosperidade em termos
desportivos.
Acompanhamos essas
saídas, mas ficou sempre a ideia, que não havendo zangas, mas que muitas miúdas
não quiseram apostar mais ,sabendo que os trabalhos seriam mais exigentes. A
juventude convive “demasiado bem” com a derrota?
O que aconteceu no
passado, nem sei nem me interessa. Eu sei,muito bem, o que fazer para que os
clubes se redimensionem, porque em todos os clubes, por onde passei,
conseguimos crescer. É óbvio, que o mérito não é só meu, é de toda a estrutura
do clube, desde treinadores a directores, mas tem que se implementar toda uma
disciplina de treino. Nos poucos treinos que já vi no Boavista, vejo ambição e
querer, nas atletas mas vejo, pouca disciplina de treino.
Qual o tempo que
precisa para colocar uma equipa a jogar no Nacional? Um/dois anos?
Pelo que vi e repito,
foi pouco, considero que temos uma, ou até mesmo duas, equipas que trabalhando
bem, têm (já) condições para lutar por essa ambição na próxima época.
Podemos saber a que
equipas se refere?
A equipa de Juniores e
a futura equipa de Cadetes, que é este ano a de Iniciadas. São duas equipas que
já estão estruturadas, têm conhecimento e experiência da competição, estão
muito bem treinadas e temos que apostar como objectivo dessas duas equipas
atingir o campeonato Nacional, mesmo que depois na prova as coisas, possam não
correr muito bem. O principal objectivo é entrar no Nacional.
Nos outros escalões. Que
há a fazer?
Considero. Que precisamos
de fazer um trabalho de raiz, especialmente nos escalões mais baixos, e esperar
dois anos, para que as coisas apareçam e eu, espero e aposto que vão acontecer.
DESPORTO EM PORTUGAL
Com o conhecimento
adquirido na modalidade, somado com o conhecimento profissional, como vê o
desporto de formação em Portugal, principalmente o Voleibol?
Divido, em duas partes.
O processo formativo já não é encarado com era antigamente. Agora, há muitas ofertas
e muita diversidade de ofertas, que fazem concorrência ao desporto em que os
jovens são facilmente assediados… temos mesmo, muitas coisas. Temos um contexto
sócio/cultural completamente diferente do passado. Precisamos de muito mais
trabalho para cativar para que os jovens e as miúdas se liguem ao voleibol.
Por outro lado, eu
acho que as modalidades amadoras em Portugal são muito pouco apoiadas e divulgadas.
Basta ver um jornal, para se verificar que noventa por cento das notícias
somente se fala de futebol e, num cantinho… se fala de todas as modalidades
amadoras. Nós somos campeões europeus de Judo, de desporto adaptado de ténis
etc… o que se divulga? Futebol, futebol, futebol. O ABC, esteve numa fase final
do Europeu de andebol e ninguém falou. A própria Comunicação Social, não ajuda
muito, nem as Modalidades Amadoras, nem o desporto feminino, nem o desporto de
formação.
Antigamente havia mais
apoio?
Claramente. Eu lembro-me,
de ainda jogar e ver nos jornais notícias e resultados dos Campeonatos Juvenis,
juniores etc… e agora, nem de voleibol de seniores aparece. Aparece, agora, ao
domingo os resultados dos seniores masculinos e na segunda-feira num cantinho
os resultados do campeonato seniores femininos. Enquanto, isto, não se alterar,
não pode haver uma massificação, porque é uma política própria dos nossos
governos, não cultivar uma cultura desportiva.
Isso, incomoda-o como
professor?
Imenso e vou dar-lhe
um exemplo. Estou muito revoltado com esta decisão do actual governo, de
retirar a classificação da Educação Física, no ensino secundário, para média
final de acesso ao ensino superior. Isto, retira a responsabilidade aos alunos,
desvaloriza a Educação Física e desvaloriza, acumulativamente o desporto.
Comparando com os
vizinhos Europeus em que os alunos são libertos do período escolar, num horário
que lhes permite praticar desporto e nós “prolongamos” o tempo escolar para
além das dezoito horas. Como classifica isto numa frase?
Uma hecatombe! Um
terramoto! Uma tragédia! É anti natura.
Eu recordo, que no meu
tempo eu tinha aulas de manhã e a tarde livre. O meu filho tem aulas das nove
às dezoito. Quando o certo seria terminarmos a parte curricular, até às quatro,
quatro e meia, para depois eles “irem” para o piano, para a música, para a
pintura… para o desporto. A realidade é que os miúdos, e eu, como professor,
terminamos a escola pelas dezoito e trinta e depois temos que ir treinar
chegando a casa pelas vinte e uma , porque para se conseguir atingir o
Alto-rendimento, tem que se treinar todo os dias. Tudo isto, não é compatível
com os horários do pais… tudo, é muito complicado.
Comente esta frase. Porque
não investir nos jovens poupando no futuro nos homens?
Uma verdade indiscutível.
Com a actual política desportiva, aumentam os casos de obesidade, problemas de miúdos
com problemas cardiovasculares, de diabetes etc. tudo isto de uma forma precoce.
Consequência disso, o governo acaba por
gastar duas vezes mais dinheiro que apostando numa alteração de cultura
desportiva. Já disse na reunião com os pais, a melhor forma de os jovens se
socializarem e prepararem para a vida, é praticando desporto.
Desiludido?
Como professor, vejo
cada vez mais os alunos a não gostarem da prática desportiva. Verifico, não
lhes “apetecer” praticar as aulas de educação física e só o fazem porque são
obrigados, contrariando o passado em que as pessoas o faziam de uma forma muito
mais interessada que agora.
Foi a visão de um
professor. Qual a de um treinador?
É diferente no que
respeita ao treino. Enquanto na escola o aluno é obrigado a estar lá, no treino
não é! Logo, só está no treino quem quer. Por isso, quem treina tem que cumprir
normas e disciplina. Quem não cumpre é convidado a sair. Ou sai quem não cumpre
ou sai, quem orienta os treinos. Se acabam por ser os treinadores a terem que
sair, no caso de a direcção assim decidir, ficam os atletas a “brincar” aos
treinos, levando o desporto de competição de uma forma lúdica. Quem quer o
desporto de uma forma lúdica inscreve-se em ginásios e levam tudo na
brincadeira e de forma descontraída. Na competição, não há lugar para quem
pense assim.
É o tal convívio pacífico
com a derrota?
No desporto tem que
haver objectivos, têm que se cumprir regras. Ainda, para mais, num clube, como
o Boavista, com tradições enormes no Voleibol nacional.
Esteve sete anos num
clube. Vem para o Boavista por mais sete?
Saí de um clube
maravilhoso de bem com todos e com saudades de todos. Ingressei num grande
Clube Nacional. Tenho um projecto que é ambicioso e no qual me dedicarei
completamente. Para além de um desafio é uma honra estar no Boavista. Enquanto
as pessoas, acharem que sou útil, estou disponível com a minha característica de
sempre. Quando, verificar que nada mais posso fazer, que os objectivos estão
cumpridos, ou que estou a mais, saberei retirar-me. Mas até lá estou de corpo
inteiro no Boavista.
Entrevista de
Manuel Pina