Na vida de
um desportista, os ciclos estão em constante movimento e por maior que seja a
identificação com um emblema, virá o tempo de mudar a página.
Nesta fase
de mudança encontra-se o técnico de andebol, Henrique Santos, que após oito
anos de xadrez se preparar para mudar. Conversamos com um homem algo triste,
mas consciente do seu trabalho em prol do Boavista e aceitando a hora de
mudança.
Havia quem
tivesse algum receio da vossa participação no escalão principal nacional. Mas a
equipa terminou numa excelente posição. Surpreendeu-o essa prestação dos
Juvenis?
Confesso que,
sempre considerei ser possível a manutenção, mas até eu fiquei surpreendido com
a classificação final. Depois de acabarmos a primeira volta em penúltimos ou antepenúltimos,
acabamos em quarto lugar nessa fase, na qual o terceiro dava acesso à fase
seguinte. Todos quisemos chegar mais alto, mas o objectivo principal foi
conseguido com brilhantismo e muito mérito. Estamos de parabéns e considero uma
época positiva.
Mas o início
foi difícil. Quais os motivos?
Foi complicado
porque tivemos grandes alterações no plantel. Cinco jogadores saíram do
Boavista e um subiu aos juniores, numa equipa de sete, perder seis é sempre
muito complicado. Formamos uma nova equipa com alguns incitados. No início foi
mesmo complicado ao perder todos os primeiros jogos, temi que isso os
afectasse, mas a resposta foi muito positiva da parte de todos.
A disputar
um campeonato com os mais poderosos adversários, com outra condições e
ambições, o Boavista realizou um extraordinário campeonato. não o surpreendeu
na verdade?
Não. Não me
surpreendeu!
A sua equipa
era assim tão forte?
Tínhamos valor
para estar e ficar na primeira divisão. Sabíamos que ia ser difícil, que teríamos
que fazer um trabalho completamente diferente a nível de contacto e choque. Tínhamos
muitos jogadores dos iniciados, que - para quem está um pouco por fora do
andebol, não entenderá – sai de utilizar um bola dois para uma bola três, que
para eles é um autêntico canhão, porque é a bola de seniores. Tiveram muitas
dificuldades de utilizar esse tipo de bolas e a resina, mas fizeram a sua
adaptação que não sendo fácil foi conseguida aos poucos e poucos. As vitórias
começaram a aparecer com o crescimento deles e obviamente as vitórias trazem a
motivação e o grupo cresceu muito. Repare
os primeiros cinco jogos, foram cinco derrotas. Depois da primeira vitória as
coisas encarreiraram e na segunda volta só perdemos com os candidatos, que foi
o Porto e os Carvalhos.
Curiosamente
o ano passado fizeram um campeonato idêntico aos vencerem todos os jogos...
É um grupo
muito forte e muito unido, não sendo um grupo com a qualidade que todos queríamos
e para isso é preciso dar tempo ao tempo, mas é um grupo muito coeso que formam
uma excelente equipa. Continuando a crescer para o ano estarão nos juvenis de
pedra e cal.
Ainda não
tenho a confirmação, mas consta-se que o Henrique vai sair do Boavista.
Confirma?
É verdade,
sim senhor. Fizemos agora a Taça encerramento que vencemos – registe-se – e no
final da época sairei do clube onde estou há oito anos.
A Taça
encerramento era importante?
Foi disputada
por quatro equipas, mas muito fortes e vê-se pelos resultados muito
equilibrados que era uma prova importante e que vencemos com inteiro mérito.
Voltando à sua
anunciada saída. Quer falar um pouco das razões?
Após o
último jogo da taça, comuniquei aos jogadores que iria embora e só após essa
conversa é que tornei pública a noticia da minha saída, porque eles teriam que
ser os primeiros a saber.
Tem outro
projecto?
Desculpe,
mas são coisas que eu não quero abordar aqui, para me defender a mim e ao
Boavista. Como disse na carta que tornei publica, só tenho que agradecer a este
clube pelos oito anos que aqui passei. Neste momento, não tenho projecto algum,
embora os convites tenham começado a aparecer mas ainda não me debrucei sobre
nenhum. Uma certeza, porém, parado não vou ficar e em breve terão notícias
minhas. Neste momento, desejo todas as felicidades ao Boavista. Ao meu sucessor
desejo todas as felicidades porque vai herdar uma equipa com valor, embora com
um plantel maís curto, porque alguns elementos vão subir a juniores e dos
iniciados ninguém sobe.
Esses pormenores
passam muitas vezes ao lado dos espectadores. Mas são um problema para os
treinadores?
São as
realidades que a formação apresenta e que todos os treinadores têm que superar.
Mas da equipa de iniciados podem ir buscar antecipadamente alguns porque têm
jogadores com valor para isso.
O que se sente
na hora da despedida?
Um bocado de
nostalgia, mas como se diz as pessoas passam e o clube fica e continua. Só posso
dizer bem deste clube, fui bem recebido, bem tratado e mesmo dentro das enormes
dificuldades que tivemos principalmente em termos logísticos. Tivemos que treinar
em “meio pavilhão” andamos constantemente com a casa às costas, foram anos difíceis
que todos tivemos e que poucas pessoas imaginam, mas acabaram por unir os
grupos porque todos sabíamos as condições, todos os aceitávamos e todos as ultrapassamos.
Os grupos fazem assim.
Ninguém defende
que as dificuldades ajudam, mas eu vi este grupo ser formado nos infantis até
aqui e verifiquei que os jogadores tratam o Henrique por tu embora sem nunca o
desrespeitar. São quase irmãos do treinador. Como se pode gerir um grupo assim?
Há aqui uma
coisa que as pessoas têm que ver e correndo o risco de ser criticado, pelo que
vou afirmar, mas afirmo sem receios. A formação do Boavista evoluiu muito e
todos os anos saem daqui jogadores para clubes com maiores ambições. Não estou a dizer que saem verdadeiros aristocratas de
andebol, mas têm saído bons atletas que têm singrado em vários clubes, Porto,
Águas Santas etc… tivemos um atleta que este ano foi campeão nacional pelo
Águas santas que na época anterior foi vice-campeão nacional aqui, que é Pedro
Silva. O ano só à equipa de juvenis vieram buscar cá cinco jogadores. Isto prova
que há no Boavista um excelente trabalho de base desde os infantis. Eu ando há
um ano ou dois a dizer que a formação do Boavista é das melhores formações do
norte. Tem uma pessoa como o Vitor Nascimento, a trabalhar “cá em baixo”, que é
fenomenal que deixa os jogadores a jogar de olhos fechados…
Se o Vítor
confirmar a saída é uma grande perda?
Enorme! Essa
é a maior perda do Boavista, se o Vítor sair. Primeiro é um símbolo do clube pelos anos que
cá está e depois, nestes escalões de formação o Vítor é qualquer coisa!
Regressando á
sua ideia…
O Boavista é
um clube muito mais apetecível que quando cá cheguei. Tem outra estaleca, tem
outros escalões muito bons, tem os juvenis na primeira divisão, tem os
iniciados que discutem sempre as fases finais e para além da excelente prova
dos juniores que nesta fase venceram toda a gente e têm os seniores que subiram
de divisão. É um clube apetecível. Isto é uma coisa fantástica, agora as
pessoas não podem exigir que se ganhe sempre.
Diferente de
outros tempos?
Quando cá
cheguei disseram-me que eu tinha uma equipa e eu… tinha cinco jogadores! Fui buscar
jogadores ao futsal do Freixieiro que eram meus conhecidos, que não sabiam
jogar futsal e trouxe para o andebol, fui buscar jogadores ao voleibol e fiz a
tal equipa, que foi a uma fase final de segunda divisão de iniciados. As coisas
de há oito anos para cá evoluíram muito. Nesse tempo jogar com o Boavista nem
contava era vitória certa. Agora toda a gente respeita e teme, jogar com o Boavista
é um jogo grande do campeonato. dos infantis aos juniores, nos últimos dois
anos o Boavista tem feito carreiras fenomenais. Só um exemplo. Quem viu aqui o
jogo de seniores entre o Boavista e o Monte, que era um jogo decisivo, só um
dos sete titulares veio de fora do Boavista. Todos os outros seis eram da
formação do Boavista! Tirando o Miguel
que veio do ABC, toda a restante equipa,
foi feita aqui.
Quem nos lê
fará inevitavelmente a pergunta. Sendo assim porque sai?
Vou embora
porque o departamento decidiu que assim terá que ser.
Não foi
opção pessoal?
Não! se
calhar tentado introduzir novas ideias, novas pessoas – que é bom – e todos
temos que mudar um pouco os ares. Mas confesso, que não foi da forma que eu
gostava que fosse. Mas atenção. Não tenho nada a ver com ninguém eu estou
completamente agradecido ao Boavista, eu aprendi muito aqui neste clube onde me
dou e darei bem com todos.
Entrou de um
clube e saiu (também) Boavisteiro?
Quem consegue
estar neste clube sem se sentir Boavisteiro? Muita luta, muito esforço, muitas
dificuldades que provocam uma união e um respeito por este emblema. Não saio
Boavisteiro, serei sempre uma parte Boavisteiro.
Entrevista
de
Manuel Pina